segunda-feira, 13 de junho de 2011

Um risco chamado Oriente Médio

As turbulências que atingem países da região acendem um sinal de alerta para empresas estrangeiras interessadas naquele mercado. Com as brasileiras não é diferente

Por Sherban Cretoiu

Investir no exterior é uma das mais complexas decisões da estratégia empresarial. Estabelecer filiais comerciais ou produtivas em outro país signifca assumir riscos diferentes daquelas incertezas econômicas que envolvem qualquer investimento. Além do ambiente de negócios, é preciso levar em conta a questão legal e o clima político. Os desafios não são nada triviais e, nesses casos, humildade e cautela são fundamentais para que o empreendimento seja bem-sucedido.

tanque-guerra-350O Oriente Médio, por razões que transcendem em muito a mera concentração de imensas reservas de petróleo,  é estratégico para qualquer organização em processo de internacionalização. Países densamente povoados ou com renda per capita elevada fazem esses mercados extremamente atrativos. Proporcional ao volume de oportunidades é, porém, o tamanho dos desafios para as companhias brasileiras que ali instalam subsidiárias – tanto para produção ou prestação de serviços como para comercialização de produtos. Decifrar hábitos e culturas de negócios muito distintas das nossas já é um exercício e tanto na formulação das estratégias. Esse desafio vem acompanhado da necessidade de operar em ambientes legais e políticos muito diferentes e diversificados dentro da própria região.

A julgar pelos dados obtidos na edição 2010 do Ranking das Transnacionais Brasileiras, pesquisa anual realizada pelo Núcleo de Negócios Internacionais da Fundação Dom Cabral, algumas empresas brasileiras instaladas no Oriente Médio têm considerado os benefícios da presença na região maiores que os desafios e riscos lá existentes.

Das 41 companhias que responderam à pesquisa, oito possuem subsidiárias produtivas ou comerciais na região. Juntas, Banco do Brasil, DHB, Marcopolo, Odebrecht, Petrobras, Randon, Vale e Weg somam 13 operações, com unidades nos seguintes países: Omã, Emirados Árabes Unidos, Egito, Irã, Marrocos e Argélia. Os setores são os mais variados: construção civil, mineração, petróleo, veículos, autopeças e implementos agrícolas. Sabemos que algumas outras também se estabeleceram naquele território ou exportam para a região volumes significativos a partir de suas operações no Brasil – ou mesmo em outros países.

A imprevisibilidade e a rapidez dos recentes fatos políticos trouxeram o Oriente Médio para o centro das preocupações da comunidade internacional e para o foco da imprensa. Para o sistema econômico mundial e para as empresas em particular, os episódios na Tunísia, no Egito e na Líbia têm implicações significativas nos resultados e mesmo na continuidade dos negócios.
Para as empresas em particular, os episódios na Tunísia, no Egito e na Líbia têm implicações significativas nos resultados e na continuidade dos negócios
Ao contrário dos riscos econômicos e comerciais que uma empresa pode facilmente identificar, calcular e mitigar, o risco político é muito mais complexo de avaliar, até porque tem um caráter maior de imprevisibilidade. No momento de decisão do investimento inicial, o empresário pode lançar mão do conhecimento prévio que tem do mercado e de informações e avaliações de seus parceiros,  por meio de entidades empresariais, embaixadas, consulados e câmaras de comércio. Pode, também, contratar consultorias especializadas em risco político e projeção de cenários. A partir do momento em que se estabelece em outra nação, a organização conta com estrutura própria e a interlocução com stakeholders e parceiros de negócios pode facilitar o trabalho de avaliação do risco político.

Quanto maior a inserção da empresa na comunidade, mais ela diminui a sua liability of foreigness, termo que ilustra a dificuldade que uma companhia costuma enfrentar em terreno alheio justamente por ser estrangeira. A origem da empresa tem peso considerável nas consequências a que ela está suscetível nos casos de revolta popular e revoluções políticas – em que os componentes ideológicos e xenófobos tendem a se sobressair. Neste quesito, nossas empresas se beneficiam do fato de o Brasil ter construído ao longo da história uma tradição de não intervenção e respeito à soberania das nações. Isto, no entanto, não significa que estão isentas de riscos e, pelo que a mídia tem mostrado, precisam se mobilizar rapidamente para evitar danos permanentes aos seus investimentos, assim como garantir a integridade física e psicológica de seus funcionários.

Os acontecimentos recentes também ensinam que são bem diferentes os riscos que as empresas podem ter de enfrentar nessas situações. No Egito, em que as manifestações se concentraram nas ruas e tinham um alvo político interno definido, a solução encontrada garantiu a governabilidade e, embora a mudança de regime que se configura seja relevante, não há sinais de ameaças imediatas aos investimentos estrangeiros e mudanças radicais na política econômica. Na Líbia, em que a situação deteriorou em guerra civil e intervenção militar estrangeira, os danos possíveis são muito maiores e a instabilidade econômica e política que se avizinha coloca em risco direto a continuidade de vários projetos e o funcionamento da economia como um todo.

O Oriente Médio não representa ainda um foco geográfico importante na internacionalização das empresas brasileiras. E os acontecimentos recentes certamente não contribuem para uma presença maior de brasileiros naquela região. Essa é uma consequência natural da elevação de percepção de risco por parte dos empresários. Uma empresa que se estabelece no exterior tem a expectativa natural de retorno para seu investimento. Recuperar via operações lucrativas o capital investido e remunerá-lo a uma taxa que supere alternativas como um possível investimento no mercado financeiro é função dos gestores. Por mais que empresas brasileiras tenham uma facilidade e predisposição para lidar com o risco e ambientes pouco previsíveis, é difícil acreditar que, no curto prazo,  volumes significativos serão investidos naquela região.

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