sexta-feira, 22 de junho de 2012

Bonduki enxerga a luz no fim do túnel para o Setor Têxtil

O presidente do Sinditêxtil (Sindicato das Indústrias de Fiação e Tecelagem do Estado de São Paulo), Alfredo Emílio Bonduki, acredita que há uma luz no fim do túnel para o setor têxtil. A esperança é que as salvaguardas para o setor de confecções, a queda na taxa de juros e a desvalorização do câmbio possam dar um fôlego ao segmento que sofre com a concorrêncial desleal com os produtos asiáticos. O dirigente empresarial fez uma análise da conjuntura econômica no Jornal da Notícia, apresentado por Walter Bartels e Edmilson Barbosa, o Magrão.


Bonduki disse que a presidente Dilma Rousseff (PT) enxergou que o câmbio estava muito baixo e o juro muito alto. O Brasil recebeu muito dinheiro de fora nos últimos anos. Essa política iniciada com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) de juro alto para equilibrar a inflação criou uma distorção grande, porque o real foi uma das moedas que mais se valorizou enquanto o dólar e o iene foram aquelas que mais de desvalorizaram.

Além disso, o juro alto aumenta o custo das empresas. Na hora de pedir um empréstimo, os juros eram de 3% a 4% ao mês, enquanto os bancos de alguns países cobram isso ao ano dos empresários. Uma das mudanças mais importantes é a redução da taxa de juros.

"Esse reposionamento da taxa real de juros vai trazer o câmbio, como já se iniciou, para um patamar mais razoável. E isso é uma bela luz no fim do túnel. Outra luz importante que pode estar ajudando a gente é a salvaguarda que a ABIT (Associação Brasileira da Indústria Têxtil) e o Sinditêxtil já fizeram o pleito e ele precisa ser implementado. Nós iniciamos um trabalho na confecção. E agora também estamos iniciando o mesmo trabalho na área de tecido de decoração, que é muito importante para essa região, e tecidos técnicos também. Eu acredito que, com a salvaguarda, com a desoneração do Plano Brasil Maior e com uma melhor política de juro e câmbio, nós temos sim esperança porque o Brasil terá um crescimento de consumo muito grande na área têxtil nos próximos dois, três anos".

ENTRAVES
Ao contrário de muitos empresários que estudam vender tudo o que têm no Brasil e se instalar nos países asiáticos, Bonduki, que trabalha no setor há mais de 30 anos - o pai dele fundou a empresa em Americana em 1963 - não pretende migrar seus negócios. "Eu amo esse setor. Eu acredito nesse setor. O Brasil é o quinto maior produtor têxtil global, apesar de todas as dificuldades. É o quarto maior produtor de confecções. Então, Walter, honestamente, eu acho que o Brasil tem condições de continuar sendo um grande player, mas, é claro, precisa de mudanças estruturais que permitam que as indústrias tenham maior competitividade", enfatizou.

O setor enfrenta três problemas que atrapalham o crescimento e a rentabilidade das empresas do ramo. Dois setores são de origem interna e um, de origem externa. O de origem externa é a concorrência com os produtos asiáticos, principalmente da China, país que representa hoje 70% das importações para o Brasil e praticamente 80% da produção global de muitos produtos, como o poliester.

"As empresas brasileiras não concorrem com empresas chinesas ou empresas asiáticas. Elas concorrem com o governo, com uma política de governo que permite que a indústria têxtil seja tão competitiva lá", deixou bem claro. No Sinditêxtil e na ABIT foi feito um levantamento com os sindicatos patrocinais similares mexicanos e americanos. A conclusão foi que os exportadores têxteis asiáticos e chineses contam com 27 tipos de subsídios diferentes.

"Então, fica muito difícil nós concorrermos com essas empresas com todo o subsídio tributário, de juros e de câmbio, porque o câmbio brasileiro foi o que mais se valorizou depois da crise de 2008 e, ao contrário, o ien ficou atrelado ao dólar e sofreu uma forte desvalorização.

Então, esse problema externo é insolúvel. Você só consegue resolver através de salvaguardas, através de uma maior proteção e de um maior controle das importações", analisou o empresário.

CARGA TRIBUTÁRIA
Os problemas internos afetam não só a indústria têxtil mas também toda a industrialização do país. Segundo Bonduki, esse processo de desindustrialização é real. Tanto que a indústria teve uma participação muito maior no PIB (Produto Interno Bruto), a somatória de toda a riqueza do país, e acabou perdendo espaço ao longo dos anos em função de uma elevada carga tributária.

O governo recolhe hoje 60% dos impostos em cima da indústria. Então, reforça, é um setor extremamente sobrecarregado com tributos. São tributados o trabalho, ou seja, a folha de pagamentos; e o investimento. "Isso é uma distorção que atrapalha o crescimento da indústria. Então eu posso dizer que a indústria empobreceu no país nos últimos anos", afirmou.

O terceiro entrave, de ordem interna, se originou a partir do fim do acordo Multifibras em 2005. Existia um sistema de cotas que regulava o comércio internacional e esse acordo foi encerrado há sete anos. Então os países começaram a procurar acordos bilaterais. Por exemplo: o Peru fez acordo com os Estados Unidos, a Colômbia fez com a Europa e, agora, em maio, conseguiu um belo acordo de livre comércio têxtil com os Estados Unidos. Esses países, com esses acordos, conseguiram canais de exportação.

O Brasil, até 2005, era exportador líquido têxtil, não era importador. E, neste ano, deve ter um déficit de US$ 6 bilhões na balança comercial. Isso aconteceu rapidamente. Para Bonduki, o que o Brasil precisaria é, através do Itamaraty, buscar os acordos de livre comércio com os grandes consumidores têxteis da atualidade, os Estados Unidos, a Europa e o Japão.

PLANO BRASIL
Cada vez mais o empresário brasileiro sofre com o Custo Brasil, com o peso dos impostos. Enquanto isso os grandes países asiáticos como China, Índia e Indonésia precisavam gerar empregos. E a indústria têxtil é uma grande geradora de empregos. Enquanto a carga tributária no País cresceu - na época do presidente Fernando Henrique Cardoso a carga tributária equivalia a 25% do PIB - e hoje chega quase aos 40%.

Hoje a carga tributária ficou maior, mais complexa e mais concentrada na indústria. E esses países, ao contrário, desoneraram a produção pela necessidade da geração da empregos. Então esse problema foi se agravando ao longo dos anos.

O Plano Brasil Maior foi o primeiro evento de um início de desoneração e quebra de paradigmas. Por isso Bonduki reconhece esse mérito. Inclusive as entidades do setor participaram dos debates e discussões das últimas medidas alinhavadas pelo ministro da Fazenda Guido Mantega, em dezembro. E o setor têxtil foi um dos quatro privilegiados.

INTERNACIONAL
Nos Estados Unidos, bem lembrou Bartels, a indústria têxtil foi praticamente extinta. Então o apresentador perguntou se o Brasil corria o mesmo risco. Bonduki explicou que os Estados Unidos abriram mão da indústria de confecção. Continuam sendo o maior produtor têxtil global.

O que os Estados Unidos fizeram foi uma política até certo ponto inteligente na época, mas hoje os empresários se arrependem, contextualizou o presidente do Sinditêxtil.

Na época, os Estados Unidos estavam com pleno emprego e não queriam manter os empregos baratos. Para evitar a imigração e forçar os moradores de países do Caribe e América Central a permanecerem nos seus países, foram criados os acordos Nafta e Kafta pelos quais os Estados Unidos produziam o têxtil, exportavam o tecido para o México, a República Dominicana e a América Central para confeccionar e, depois, os artigos retornavam para os Estados Unidos.

"Então foi uma forma de manter o mercado cativo para sua indústria têxtil, manter empregos em zonas periféricas onde tinha muito problema político, tinha muito problema de plantação de drogas, e criar um emprego saudável e manter esse mercado sob controle da indústria têxtil americana", explicou. Hoje o país americano se arrepende porque precisa gerar empregos, inclusive nas confecções. E esse processo iniciou uma reversão. Foi uma política deliberada traçada pelo Departamento de Estado Americano e que funcionou para eles, até agora.

Mas os Estados Unidos ainda não um dos maiores plantadores de algodão do Planeta. Mas eles preferem exportar o fio e o tecido do que o algodão. Diferente do Brasil, que vai ter a quarta maior colheita de algodão, praticamente dobrando neste ano em relação ao ano passado, dois milhões de toneladas, e vai exportar quase metade para a Ásia e depois importar a camisa pronta.

LUCRO FÁCIL
O também apresentador Edimilson Barbosa, o Magrão, como facionista, questionou o posicionamento de deputados que sugeriram que os empresários do setor têxtil se instalassem na China para ganhar dinheiro. Bonduki disse que hoje a tendência é pelo lucro fácil e imediato.

Mas afirmou que essa não é a melhor saída para o País, porque não tem uma renda per capita suficiente para abrir mão da sua indústria. Basta lembrar que grande parte da área de serviços - como empresas de contabilidade, de limpeza, de segurança, de software - gira em torno da indústria. "Sem uma indústria forte você não vai ter um País forte e rico. A indústria é que gera o emprego de bom salário. Não é o comércio", deixou bem claro.

IMPORTAÇÃO
Para dimensionar a revelância da indústria, citou que o Estado de São Paulo tem 10 faculdades têxteis. No Brasil são 64 cursos. Nos últimos dois anos a indústria têxtil investiu US$ 2 bilhões por ano. Apesar de toda a crise, no ano passado, o investimento foi de US$ 2,5 bilhões. Por isso quando presencia o desenrolar dos fatos, fica triste, porque todos sabem que existem grupos de pressão, de lobby.

E hoje os grandes varejistas e traders importadores querem defender esse espaço para importar da China, da Índia, do Paquistão. A bola da vez é o Vietnã, que está crescendo na confecção. Isso porque uma parte da mão-de-obra da China já está cara para o padrão deles e as indústrias têxteis chinesas estão terceirizando uma produção para Bangladesh, Camboja, Vietnã, onde a mão-de-obra custa menos de US$ 100. Na China, na costa, a mão-de-obra está acima de US$ 150.

UNIÃO
Quando a indústria automobilística tem um resfriado, o governo Federal, de imediato, lança pacotes para socorrê-la. Com a indústria têxtil isso nem sempre ocorre. Contudo, para Bonduki, a indústria têxtil tem uma força de influência sobre o governo Federal muito mais forte do que tinha. E aproveitou o gancho para dizer que a ABIT é uma das entidades mais respeitadas de Brasília e foi uma tentativa bem-sucedida para unificar os interesses da cadeia toda, porque um empresário é cliente do outro. Hoje, o segmento tem grupos de trabalho no Ministério da Fazenda, no MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) e no Itamaraty.

"Essa união é muito importante para que nós possamos fazer em Brasília os nossos pleitos de forma equilibrada, sem prejudicar alguns dos elos da cadeia", defendeu o empresário. Por isso, Bonduki afirmou que gostaria que o Sinditec (Sindicato das Indústrias de Tecelagem de Americana e Região) ficasse um pouco mais alinhado com os trabalhos feitos no Sinditêxtil e na ABIT. Essa é uma batalha pessoal de Bonduki, por amar a cidade e o setor, como disse. E essa união tem que ser cada vez mais reforçada, ressaltou. Não pode ter dissidências e disputas no setor, comentou. A meta seria falar como um setor único, não importa se é plantador de algodão ou confeccionista.

Recentemente, o setor atraiu o varejo. Tanto que o pleito que será feito ao secretário da Fazenda do Estado de renovação do decreto de redução do ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) que vence no final do ano está sendo feito em parceria com o varejo têxtil. "Como um setor todo, nós somos quase tão importantes, do ponto de vista de PIB, quanto o setor automotivo". O setor automotivo faturou US$ 90 bilhões no ano passado e a indústria têxtil faturou US$ 63 bilhões, gerando muito mais empregos.

CADEIA
Uma das vantagens do Brasil é que tem todos os elos da cadeia têxtil. É um dos poucos países que tem todos esses elos das cadeias e o único fora da Ásia. O país tem desde a plantação de algodão, fiação de poliester até a tecelagem. E todos estão investindo. Isso é um patrimônio muito grande e o País não pode abrir mão disso, argumentou.

Reconhece que o setor foi privilegiado no Plano Brasil Maior, mas não teve a velocidade que o setor automotivo conta. Então, o setor está lutando em cima das salvaguardas. "Hoje nós temos que proteger a confecção, que é o elo mais frágil, mais vulnerável. Na hora que você importa a confecção, você mata tudo".

RETALHO FASHION
Mudando o foco das dificuldades do setor, Bartels pediu a Bonduki para comentar a iniciativa iniciada há três anos, o Retalho Fashion. Ele disse que há um problema muito sério com os retalhos das confecções nos bairros do Bom Retiro e do Brás, na capital paulista. Os retalhos eram colocados em sacos de lixo e deixados nas calçadas. Então, os catadores abriam os sacos, escolhiam os melhores restos e as sobras ficavam nas calçadas. Quando chovia, os retalhos eram arrastados para os bueiros, que ficavam entupidos. Então esses retalhos iam para aterros sanitários e demoravam 100 anos para serem decompostos.

Além de sobrecarregar ambientalmente o aterro, não resolvia o problema social. Os catadores ganhavam R$ 10 ao dia e conviviam com a cracolândia ao lado. Então as entidades patronais fizeram o projeto junto com a Prefeitura de São Paulo para reaproveitar todo o material. E o absurdo é que o Brasil importa ao ano para a indústria de reciclagem 50 mil toneladas de retalhos, o que dá margem para importação de lençóis contaminados, como ocorreu em Pernambuco. E o Brasil mal controlava a entrada de tais tecidos.

Em vez de importar lixo de outros países, o material é reciclado, recebe a destinação correta e faz com que os catafodores tenham emprego digno e usufruam economicamente do produto do seu trabalho. O lançamentodo projeto será no dia 21 de junho no Senai do Bom Retiro. "Eu acredito ser esse sim um exemplo para que em outras cidades importantes onde existe confecção - Americana é uma, Ibitinga é outra - isso possa ser replicado". Esse projeto foi apresentado ao governo Federal, que o incluiu como um dos principais programas de sustentabilidade do setor têxtil brasileiro, a ser apresentado na Rio+20.

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